26.9.12

{Lunch at De Kas} Um almoço na estufa ou o elogio da simplicidade

De Kas, Amsterdam

Fica logo a seguir à pequena ponte sobre um dos infindáveis canais. Uma estufa e uma enorme chaminé de tijolos alaranjados onde um casal de cegonhas fazem o ninho. Se a meteorologia fosse clemente, no dia de Verão em que visitamos o De Kas o céu teria mostrado o seu azul e a luz teria feito jus à beleza do lugar. Não foi o caso. Choveu copiosamente em Amsterdão nesse dia. Nada que mudasse os planos de almoço feitos semanas antes.

No De Kas há uma história para contar. Uma estufa municipal prestes a ser demolida ganha novo alento graças ao sonho de Gert Jan Hageman: construir um restaurante (quase) auto-suficiente. No De Kas acreditamos firmemente que a comida sabe melhor quando é preparada com ingredientes frescos, cultivados e colhidos respeitando a natureza.

Um princípio que começa a ser aplicado quando os visitantes são convidados a passear pela estufa, a cheirar e ver os vegetais que depois encontram no prato, ali mesmo ao lado.

De Kas, Amsterdam De Kas, Amsterdam

No menu diário do De Kas todos ingredientes são biológicos e, sempre que possível, provenientes da horta e estufa do restaurante. Comer tomate que foi apanhado 2 horas antes a 10 metros de distância e trazido até à cozinha por mãos cuidadosas faz toda a diferença. O menú muda todos os dias e é fixo. Os comensais podem informar o chef de qualquer alergia alimentar ou de má vontades com certos ingredientes mas desconhecem o que vão comer até o prato lhes ser colocado à frente.

Enquanto nos explicam este modus operandi, chegam à mesa uns tomates cereja de várias cores marinados com ervas, umas gigantescas azeitonas de Puglia, azeite e um pão caseiro irresistível. Vamos petiscando ao ritmo calmo que o lugar impõe. Não há pressas nem na sala, nem na cozinha aberta. Como se tudo fosse para ser vivido devagar. Ou assim me pareceu ainda a mesa não tinha sido inundada por 3 entradas.

De Kas, Amsterdam



Vão chegando. Todas ao mesmo tempo. Com a nossa empregada a explicar em detalhe cada um dos pratos, os seus ingredientes e as técnicas utilizadas. Uma infinidade de detalhes. Vou fazendo notas mentais, maldizendo a má sorte de não poder rabiscar qualquer coisa. Decido servir (sim servir, porque as doses vêm juntas) uma solha cozinhada na perfeição, acompanhada por uma salada de laranja e beterraba amarela e roxa, camarões, chips de funcho e rodelas de laranja confitada. Uma combinação com tudo para dar certo. E ainda por cima, muito bonita.

A opção das entradas não virem empratadas não me convence totalmente. Não vejo razão para que tal aconteça. E já agora, para chegarem à mesa todas ao mesmo tempo. Comer primeiro o peixe, ainda quente, provou ser uma decisão acertada.

De Kas, Amsterdam
De Kas, Amsterdam

Seguimos com uns (falsos) cannelloni de curgete com recheio de ricotta e ervas, com presunto (arrisco dizer) ibérico, espuma de batata e flores de curgete com rebentos de agrião. As cores verde, vermelho e amarelo e o branco a pautar o menos favorito de tudo o que comemos no De Kas. Em teoria, nada de mal. Na prática, apenas um prato simpático. Talvez culpa da solha perfeita com que iniciámos e do nosso palato cheio de expectativas. Que haviam de ser superadas com a mais simples das 3 entradas, uma maçaroca de milho-doce assada com manteiga picante e coentros. Imagino que esta é a comida que servem no céu. Ou é lá que me sinto e não quero voltar.

Acabo por fazê-lo assim que a mesa é levantada e o prato principal é servido. Alabote (de novo confeccionado na perfeição) com maionese (seria aïoli?), chanterelles com puré de abóbora e gnocchi panados, crocantes de abóbora, espinafres e salada de tomate zebra. Muito bom. Um prato de fim de Verão a piscar o olho ao Outono. É que no De Kas mandam as estações. E os chefs. Eu, por mim, não me importo de lhes obedecer.

De Kas, Amsterdam

Para terminar, o inevitável expresso, sem o qual uma refeição nunca está completa. Pelo menos, para mim. Aqui com o selo Boot Koffie e tirado na perfeição. Vinha acompanhado de umas mignardises deliciosas, panforte, turrón com pistácios e uma bolachinha holandesa de nome impronunciável.

Foi bebido a folhear o livro com os produtos da horta e a ver as receitas do chef - é que o livro só existe (in)felizmente em Dutch.

De Kas, Amsterdam

Foram as despedidas de um serviço impecável, entre o sóbrio, o informado e o simpático. Sem ser demasiado ostensivo. A atestar o enorme cuidado colocado em cada momento que passamos no De Kas. Acompanhados à porta, com a chuva a cair como nunca, somos convidados a levar connosco, para o lanche, uma maçã biológica colhida nessa manhã.

Havia de comê-la apenas no dia seguinte, a pensar o quanto me apetecia voltar ao De Kas. Qualquer dia vou.

De Kas, AmsterdamDe Kas, Amsterdam

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De Kas
Kamerlingh Onneslaan 3
1097 DE Amsterdam